Reflexos Jurídicos em Decorrência da Pandemia de COVID-19

 

Sumário

Artigo I.       Introdução

Artigo II.      Do Direito Cível

Seção 2.01     Do Estado de Calamidade Pública e da força maior

Seção 2.02     Dos contratos particulares

Seção 2.03     Das relações com instituições financeiras

(a)     Caixa Econômica Federal

(b)     Banco do Brasil

(c)     Itaú Unibanco

(d)     Santander.

(e)     Sicoob

Seção 2.04     Das passagens áreas

Seção 2.05     Dos planos de saúde

Artigo III.     Do Direito Trabalhista

Seção 3.01     Da celebração de acordos individuais

Seção 3.02     Da Interrupção das atividades e os bancos de hora

Seção 3.03     Das faltas justificadas

Seção 3.04     Da redução salarial e da jornada de trabalho

Seção 3.05     Da rescisão motivada por força maior

Seção 3.06     Da convalidação das medidas adotadas anteriormente

Seção 3.07     Da segurança do trabalho

Seção 3.08     Do Home Office

Seção 3.09     Do adiantamento das férias

Seção 3.10     Do pagamento das férias

Seção 3.11     Das férias coletivas

Artigo IV.    Do Direito Tributário

Seção 4.01     Do Simples Nacional

Seção 4.02     Do Sistema S

Seção 4.03     Do FGTS

Seção 4.04     Do IPI

Seção 4.05     Da atuação da PGFN e dos Débitos Tributários Federais

Seção 4.06     Da Declaração de Imposto de Renda de Pessoas Físicas (IRPF)

Artigo V.     Da Recuperação Judicial

Artigo VI.    Das considerações finais

 


 

Artigo I.       Introdução

 

A pandemia do COVID-19 continuando se alastrando pelo mundo e começa a atingir diretamente o Brasil. Segundo fontes internacionais a doença ainda não atingiu seu pico de contaminação e até o dia 27 de março de 2020 já havia contaminado mais de 500 mil pessoas.

Em resposta, a União, os estados federados e os municípios vêm adotando diversas medidas públicas e sanitárias com fito em mitigar e/ou retardar a proliferação da COVID-19 no território nacional, por exemplo, o isolamento social da população.

Ocorre que essas políticas possuem efeitos colaterais drásticos, principalmente, às relações comerciais, razão pela qual os empresários, destinatário principal deste informativo, devem estar atentos aos reflexos jurídicos da pandemia atual para a tomada de decisão mais assertivas.

Neste cenário, o escritório Araújo Muniz Sociedade de Advogados propõe uma breve e didática explanação sobre alguns dos pontos jurídicos mais relevantes à atividade empresarial ressaltando, porém, que a análise de casos concretos deve ser realizada de forma casuística e com assessoramento jurídico próprio.

Por isso, caso o leitor almeje estudo e/ou parecer mais específico dos efeitos jurídicos sobre seus direitos, colocamo-nos, desde já, à disposição.

Por fim, esclarecemos que o presente informativo teve com base a legislação atual – até o dia 27/03/2020 –, todavia, cediço que na vigência de crises socioeconômicas a normatização tende a se tornar mais volátil e mutável.

 

A água inteira do mar não pode afundar um navio, a menos que ela invada o seu interior. Da mesma forma a negatividade do mundo não pode te derrubar, a menos que você permita que ela permaneça dentro de você. (Caio F. Abreu)

 

Artigo II.      Do Direito Cível

 

Seção 2.01     Do Estado de Calamidade Pública e da força maior

 

Primeiramente, importante esclarecer que o reconhecimento da pandemia do COVID-19 pela Lei nº 13.979, de 06 de fevereiro de 2020, e a decretação do estado de calamidade pública por meio do Decreto Legislativo nº 06, de 20 de março de 2020, altera sobremaneira as relações jurídicas no território nacional. Isto porque, a imprevisibilidade da situação atual acarreta a aplicação excepcional de alguns institutos jurídicos, sendo, então, indispensável a busca por soluções jurídicas para afastar e/ou minorar os impactos econômicos da pandemia do COVID-19 nas atividades empresariais. 

A título de amostragem, o Código Civil brasileiro prevê situações que possibilitam o descumprimento contratual nas hipóteses de força maior ou caso fortuito que se amoldam, de plano, às circunstâncias atuais, isto é, aquela em que fatos externos, independentes da vontade humana, alteram substancialmente as condições para o cumprimento de eventuais obrigações assumidas. Por oportuno, a Medida Provisória nº 927/2020 editada pelo Governo Federal já reconheceu a incidência de força maior sobre as relações trabalhistas provocadas pela pandemia do COVID-19.

No entanto, conforme dito acima, a constatação de “força maior” sobre determinado negócio jurídico demanda análise concreta da situação específica de cada caso, tendo em vista que vários fatores como territorialidade e temporalidade – dentre outros – influenciam sua incidência.

 

Seção 2.02     Dos contratos particulares

 

Atualmente, vários contratantes se veem impossibilitados de cumprir eventuais obrigações assumidas, ocasião em que, inicialmente, recomendamos seja proposto uma repactuação extrajudicial das disposições contratadas com fito em preservar as atividades econômicas dos vários atores socioeconômicos do país e a manutenção da relação negocial entre as partes. Neste contexto, aja com boa-fé e esclareça suas dificuldades e possibilidades ao credor. A boa negociação começa pela transparência dos interesses.

Além disso, é de suma importância que se formalizem tais repactuações a fim de promover segurança jurídica para ambas as partes, seja através de novos contratos ou de aditivos contratuais, haja vista que, em algum momento, essa crise de saúde será superada.

Sendo inviável a renegociação extrajudicial dos contratos firmados anteriormente à pandemia do COVID-19, poder-se-á a partir da análise específica de cada caso pleitear judicialmente a revisão contratual ou até mesmo a sua resolução, tendo como base a teoria da imprevisibilidade e/ou da onerosidade excessiva dos contratos para um de seus signatários.

Contudo, repetimos, a análise de cada caso deve ser realizada de forma casuística, pois, embora os impactos advindos das paralisações e das variações de mercado sejam evidentes em todos os setores produtivos da nação, para que a pandemia do COVID-19 seja caracterizada caso fortuito ou força maior é necessário que se prove ou demonstre que os impactos desta crise tornaram impossível ou excessivamente oneroso o cumprimento das obrigações específicas de cada negócio jurídico.

 

Seção 2.03     Das relações com instituições financeiras

 

Diante da paralisação de grande parte das atividades econômicas do país para conter a avanço do COVID-19 a FEBRABAN (Federação Brasileira dos Bancos) vem adotando e estimulando que seus filiados procedam a renegociação de empréstimos e financiamentos.

Especificamente para pequenas empresas e pessoas físicas uma destas recomendações é a prorrogação do pagamento dos empréstimos e financiamentos por 60 (sessenta) dias, sendo que diversas instituições já aderiram, segundo informações da FEBRABAN. Para as demais hipóteses estão sendo realizadas negociações particulares com ofertas de linhas de créditos especiais de acordo com o perfil de cada cliente. Portanto, recomendamos categoricamente que o leitor busque sua instituição financeira para repactuar o pagamento de eventuais empréstimos e/ou financiamentos.

Outrossim, o governo federal anunciou nesta sexta-feira (27/03/2020) uma linha de crédito emergencial para pequenas e médias empresas e que vai ajudá-las a pagar os salários de seus funcionários pelo período de dois meses.

Porém, o dinheiro para pequenas e médias empresas vai financiar, no máximo, dois salários mínimos por trabalhador. Isso significa que quem já tem salário de até dois salários mínimos continuará a ter o mesmo rendimento. Entretanto, para os funcionários que ganham acima de dois salários, o financiamento ficará limitado a dois salários mínimos.

Outras características deste financiamento é que:

  • estará disponível para empresas com faturamento entre R$ 360 mil e R$ 10 milhões por ano;
  • o dinheiro será exclusivo para folha de pagamento;
  • a empresa terá 6 meses de carência e 36 meses para pagar o empréstimo;
  • os juros serão de 3,75% ao ano.

A operação do programa será feita em parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e bancos privados, e mais detalhes serão divulgados em breve pelo Banco Central.

 

(a)   Caixa Econômica Federal

 

Para pessoas físicas a Caixa anunciou a possibilidade de o cliente congelar por até 60 dias o pagamento de crédito pessoal.

Financiamento imobiliário, para pessoas físicas e para empresas, será possível adiar o pagamento de até duas prestações pelo aplicativo habitação da Caixa, sem a necessidade de comparecer às agências. Todo o cronograma das prestações é “deslocado para frente”, de forma a não acumular prestações no fim do contrato.

Para micro e pequenas empresas, a redução de juros será de até 45% nas linhas de capital de giro, com taxas a partir de 0,57% ao mês. Carência de até 60 dias nas operações parceladas de capital de giro e negociações, além de linhas de crédito especiais, com até 06 (seis) meses de carência para empresas que atuam nos setores de comércio e prestação de serviços. Há também linhas de crédito especiais para aquisição de máquinas e equipamentos, com até 60 meses para pagamento.

 

(b)    Banco do Brasil

 

O Banco do Brasil anunciou a ampliação de R$ 100 bilhões na quantidade de dinheiro disponível para novos empréstimos ou rolagem de dívida.

Apesar de ter colocado a mais R$ 24 bilhões para concessão de novos empréstimos ou prorrogação de vencimentos de até 60 dias, os limites de crédito PF não mudam em relação aos já vigentes até então.

Foram colocados à disposição mais de R$ 48 bilhões para linhas de capital de giro, investimentos e antecipação de recebíveis. Vale para novos empréstimos e para rolagem de dívidas que estão vencendo. Também foram disponibilizados R$25 bilhões para o agronegócio e R$3 bilhões para administrações públicas municipais e estaduais.

 

(c)   Itaú Unibanco

 

Todos os clientes PF poderão adiar por até 60 dias os vencimentos de empréstimo pessoal. 

Os vencimentos de empréstimos para capital de giro podem ser adiados por até 60 dias, mas dependem da assinatura do “Itaú Crédito Sob Medida”, que permite a alteração da data original.

Empresas com pagamento em dia poderão adiar a próxima parcela em até 60 dias, com mesma taxa de juros e sem cobrança de multa.

 

(d)   Santander

 

Os clientes PF poderão adiar o pagamento de empréstimos em linhas de crédito pessoal, crédito direto ao consumidor e financiamento imobiliário. O Santander também aumentou em 10% o limite dos cartões de crédito de clientes que estejam com a fatura em dia.

O banco está oferendo condições especiais no momento para Micro e Pequenos Empreendedores como carência do pagamento da primeira parcela nas linhas de empréstimos e financiamentos, além de produtos de renegociação com condições especiais.

 

(e)   Sicoob

 

O Banco Sicoob (Sistema de Cooperativas de Crédito do Brasil) emitiu comunicado oficial em seu site informando que estão promovendo a reestruturação, e não o simples adiamento do prazo, de operações de crédito dos segmentos afetados pela crise, além de possibilitarem a abertura de crédito para atender a esse público com condições de prazo e preço diferenciados.

Cada caso estará sujeito à análise, o que poderá ser feito diretamente na cooperativa. Ainda há recomendação no sentido de priorizar o uso dos canais digitais (App Sicoob e Internet Banking) e do atendimento telefônico para realização das transações.

 

Seção 2.04     Das passagens áreas

 

Os Ministérios Público Federal (MPF) e do DF e Territórios (MPDFT), a Secretaria Nacional do Consumidor (SENACON) do Ministério da Justiça e Segurança Pública e a Associação das Empresas Aéreas (ABEAR) assinaram, nesta sexta-feira (20), Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) que estabelece regras para remarcação, cancelamento e reembolso de passagens aéreas em razão da pandemia da covid-19.

Segundo o acordo, o passageiro que tiver adquirido passagem até a data de assinatura do TAC e possuir bilhete de voo operado entre 1º de março e 30 de junho de 2020 poderá remarcar a sua viagem nacional ou internacional por uma única vez, sem qualquer custo, respeitada a mesma origem e destino. A exceção é para voos operados em “code-share”, “interline” (acordo de compartilhamentos de voos com outras companhias), por companhias que possuam parceria de plano de milhagem e voo “charter”. A remarcação poderá acontecer para qualquer período dentro do intervalo de validade da passagem, sem a cobrança de taxa de remarcação ou diferença tarifária.

Os passageiros com passagens compradas para períodos de “alta temporada” (julho, dezembro, janeiro, feriados e vésperas de feriados) poderão remarcar a viagem para qualquer data compreendida pelo tempo de validade do bilhete. Já quem comprou passagens para baixa temporada poderá remarcá-las gratuitamente para voos a serem operados também em baixa temporada. Caso o consumidor queira remarcar para datas de alta temporada, deverá pagar diferença tarifária. Também é possível remarcar a viagem para outro destino, com eventual pagamento de diferença da tarifa.

O TAC também prevê política de cancelamentos de voos. Pelo acordo, as passagens adquiridas até a data de assinatura do TAC para voo nacional ou internacional entre 1º de março e 30 de junho de 2020 poderão ser canceladas pelo passageiro sem custo adicional. O valor pago será mantido como crédito válido pelo período de um ano, a contar da data do voo. Ao remarcar o bilhete, a companhia aérea poderá cobrar eventuais diferenças de valores ou tarifas, sendo vedada, contudo, a cobrança de multas e taxas de remarcação. No caso da solicitação de reembolso da passagem, poderão ser aplicadas multas e taxas contratuais. Além disso, o valor pago pelo usuário será ressarcido em até 12 meses, sem correção monetária e sem multas, a contar da data do pedido.

Ainda segundo o documento, quando o atraso ou cancelamento do voo decorrer do fechamento de fronteiras, não será exigida da companhia aérea o fornecimento aos passageiros da assistência material prevista na Resolução 400/16 da Anac, como alimentação, hospedagem e traslado. Em contrapartida, as empresas se comprometem a auxiliar o Ministério das Relações Exteriores a localizar e trazer brasileiros localizados no exterior. As alterações realizadas de forma programada pela companhia, em especial quanto ao horário e itinerário originalmente contratados, devem ser informadas aos passageiros com antecedência mínima de 24 horas.

As empresas aéreas devem disponibilizar gratuitamente aos passageiros canais de atendimento telefônico e online para sanar dúvidas e reclamações, além de estar ativa na plataforma digital consumidor.gov.br. Administrado pela SENACON, a ferramenta permite a interlocução direta entre consumidores e empresas para solução de conflitos de consumo pela internet. As reclamações registradas até 30 de junho em qualquer um dos canais devem ser respondidas pelas aéreas no prazo máximo de 45 dias.

Ressalta-se que o Judiciário poderá ter entendimento divergente e/ou afastar a aplicação do referido TAC ao analisar e julgar casos específicos.  

 

Seção 2.05     Dos planos de saúde

 

A ANS (Agência Nacional de Saúde) realizou reunião com as OPS (Operadores de Planos de Saúde) e comunicou expressamente que o fornecimento e a realização de exames para o diagnóstico e tratamento do COVID-19 deverá estar contemplado nas coberturas mínimas obrigatórias dos planos de saúde, nos termos da Resolução Normativa ANS nº 453/2020.

Noutro lado, registra-se que essa demanda de serviços excepcionais e o estado de calamidade pública atual poderá ser utilizado como fundamento adicional dos Planos de Saúde para o reajuste anual dos valores de mensalidade.

 

Artigo III.     Do Direito Trabalhista

 

Conforme informado anteriormente o Governo Federal reconheceu a existência de hipótese de força maior sobre as relações trabalhistas no Brasil, especialmente, em virtude do isolamento social recomendado pela OMS (Organização Mundial de Saúde) e da crise econômica gerada pelo COVID-19.

Neste cenário, tornam-se exigíveis medidas rápidas e extraordinárias, visando à manutenção dos empregos e da atividade econômica dos empregadores, ocasião em que alguns requisitos formais talvez deixem de ser observados, atraindo alguns riscos futuros em prol da urgência da tomada de decisões que o empresariado hoje é obrigado a enfrentar.

Para tanto, o Governo Federal se adiantou e editou normas regulando as relações trabalhistas no cenário excepcional atual por meio da Medida Provisória nº 927, de 22 de março de 2020, amparada pelo art. 501 da CLT.

Por oportuno, frisa-se que as medidas provisórias são normatizações editadas pelo poder Executivo Federal que possuem validade de 60 (sessenta) dias prorrogáveis por igual período, e que devem ser convertidas em lei pelo Congresso Nacional, que pode, aliás, promover alterações em sua redação. Por conseguinte, caso o legislativo não converta a MP em lei, ela perderá totalmente sua validade e eficácia.

Registra-se, ainda, que a CLT e outras legislações correlatas à relação de emprego continuam em vigência, entrementes, enquanto perdurar o estado de calamidade pública do Brasil poderá o empregador agir de forma excepcional em consonância com os termos da referida MP.

 

Seção 3.01     Da celebração de acordos individuais

 

Com fito em preservar empregos em meio à crise econômica provocada pelo COVID-19, que não será considerada, de plano, doença ocupacional, o Governo Federal autorizou que o empregado e o empregador realizem acordos individuais expressos e formais ao alvedrio de alguns pontos da legislação trabalhista e de eventuais acordos ou convenções trabalhistas, observado os limites da MP nº 927/20.

Neste sentido, recomenda-se cautela na utilização desta possibilidade advinda da aludida MP, primeiramente, porque essa não foi convertida em lei pelo Congresso Nacional, outrossim, visto que há direitos básicos e fundamentais dos trabalhadores previstos na Constituição Federal que não podem ser desautorizados por legislação infraconstitucional – por exemplo, uma MP.

Em sendo assim, recomenda-se assessoria jurídica específica para celebração de tais acordos, bem como que o empregador tenha sensibilidade com a situação de seus empregados.

 

Seção 3.02     Da Interrupção das atividades e os bancos de hora

 

O empregador poderá interromper suas atividades e instituir regime de compensação de jornada por meio de banco de horas, mediante a acordo individual ou coletivo, sendo que o prazo para tal (compensação) será de 18 (dezoito) meses após o fim do estado de calamidade pública reconhecida pela União.

Ademais, a compensação poderá ser realizada através da prorrogação de até 02 (duas) horas diárias e, desde que, não exceda uma jornada diária de 10 (dez) horas, e poderá ser realizada sem autorização de entidade sindical.

 

Seção 3.03     Das faltas justificadas

 

Ausências do empregado decorrente de isolamento social e/ou de quarentena determinado por autoridade pública será reconhecida como falta justificada ao trabalho, nos termos do 3º do art. 3º da Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020.

 

Seção 3.04     Da redução salarial e da jornada de trabalho

 

É possível reduzir a carga horária e o equivalente do salário, em caráter precário e temporário, mediante autorização sindical – via acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva de trabalho – desde que demonstrado os efeitos de eventual crise socioeconômica, por exemplo, a do COVID-19, especificamente, nas atividades econômicas do empregador. Todavia, ressalta-se que tal situação excepcional não poderá perdurar mais de 06 (seis) meses e que a redução salarial não poderá ser maior que 25% (vinte e cinco por cento) do salário do empregado. Por fim, como dito a chancela sindical é indispensável.   

 

Seção 3.05     Da rescisão motivada por força maior

 

Constatada situação de força maior não ocasionada, direta ou diretamente, pelo empregador, poderá o contrato de trabalho ser rescindido da forma menos onerosa com a redução da multa de FGTS, em casos de dispensa imotivada, para até 20% (vinte por cento).

 

Seção 3.06     Da convalidação das medidas adotadas anteriormente

 

As medidas já tomadas pelos empregadores nos 30 (trinta) dias que antecederam a MP nº 927/2020 e, desde que, estejam de acordo com suas disposições e das demais legislações pertinentes, estarão automaticamente convalidadas, isto é, nesta hipótese a referida medida provisória irá retroagir temporalmente.

 

Seção 3.07     Da segurança do trabalho

 

Especialmente, por se tratar de uma crise de saúde, reitera-se que o empregador deverá manter as condições básicas de segurança, saúde e higiene para o trabalho, estabelecendo, para tanto, procedimentos concreto para proteção e prevenção ao COVID-19, por exemplo, com o fornecimento de máscaras respiratórias e álcool em gel, distanciamento dos postos de trabalho etc.

Adiante, está suspensa a obrigatoriedade de realização dos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, exceto dos exames demissionais. Estes exames deverão ser realizados em até 60 dias do fim do “estado de calamidade pública”. Conduto, caso o médico do trabalho considere que este prazo representa risco aos empregados, deverá comunicar formalmente o empregador.

Ademais, caso o exame ocupacional tenha sido realizado há menos de 180 dias, o exame demissional estará dispensado.

Por fim, também está suspensa a obrigatoriedade dos treinamentos periódicos dos empregados, devendo ser realizados em até 90 dias do fim do “estado de calamidade pública”.

 

Seção 3.08     Do Home Office

 

Como medida para reduzir a contaminação pelo COVID-19 recomendou-se que os empregadores liberassem seus funcionários para o trabalho em “home office” ou teletrabalho, quando possível, e salvo aqueles que estejam enfermos. Neste sentido, o empregador deverá comunicar o empregado com 48 (quarenta e oito) horas de antecedência, bem como deverá estabelecer mecanismos para gerenciar e controlar seus funcionários. A propósito, o acordo com o empregado deverá prever se haverá ou não algum reembolso ao empregado, além da responsabilidade pela a aquisição, manutenção ou fornecimento de equipamentos e recursos necessários à prestação do teletrabalho.

Se o empregado não possuir equipamentos ou infraestrutura para prestação do trabalho à distância, o empregador poderá fornecer em comodato ou não sendo possível o comodato, o período da jornada normal de trabalho será computado como tempo de trabalho à disposição do empregador.

Especificamente durante a vigência da situação de calamidade pública as comunicações por meio de aplicativos fora da jornada de trabalho não serão consideradas tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, salvo acordo individual ou coletivo.

Outrossim, fica dispensada a celebração de aditivo contratual ou anotação na carteira de trabalho do empregado para tanto.

Também está autorizada a adoção do regime de teletrabalho para estagiários e aprendizes.

Por fim, os valores pagos pelo empregador a título de vale transporte poderão ser suspensos dada a desnecessidade de locomoção até o local de trabalho.

 

Seção 3.09     Do adiantamento das férias

 

O empregador poderá a seu critério conceder férias antecipadas ao empregado, comunicando-o sobre o período com 48 (quarenta e oito) horas de antecedência por escrito ou por meio eletrônico. São 05 (cinco) dias no mínimo de férias e sua concessão não depende do transcurso do período aquisitivo. Frisa-se que trabalhadores do grupo de risco ao COVID-19 devem ter prioridade na concessão de férias individuais. Ademais, por acordo escrito e formalizado, empregado e empregador poderão negociar também a antecipação de férias futuras.

 

Seção 3.10     Do pagamento das férias

 

Pensando em muitas empresas que terão dificuldade, a MP nº 927/2020 permite que: a) o pagamento do 1/3 de férias seja efetuado até 20 de novembro; b) o pagamento das férias seja realizado até o 5° dia útil do mês subsequente ao início dessas.  

 

Seção 3.11     Das férias coletivas

 

O empregador poderá conceder férias coletivas, nos termos da CLT, a todos os empregados ou parte da empresa. Excepcionalmente, com o advento da MP nº 927/2020, basta a empresa comunicar o(os) empregado(os) com antecedência de 48 horas, e não se exige mais a comunicação prévia ao Ministério da Economia e aos sindicatos profissionais. Igualmente, o período de férias poderá ser estabelecido a critério do empregador.

 

Artigo IV.    Do Direito Tributário

 

Seção 4.01     Do Simples Nacional

 

O Governo Federal determinou a prorrogação do prazo de pagamento dos tributos apurados pela sistemática do SIMPLES Nacional referente aos meses de março/20, abril/20 e maio/20.

  • O Período de Apuração referente ao mês de março de 2020, com vencimento original em 20 de abril de 2020, fica com vencimento para 20 de outubro de 2020;
  • O Período de Apuração referente ao mês de abril de 2020, com vencimento original em 20 de maio de 2020, fica com vencimento para 20 de novembro de 2020; e
  • O Período de Apuração referente ao mês de maio de 2020, com vencimento original em 22 de junho de 2020, fica com vencimento para 21 de dezembro de 2020;

 

Seção 4.02     Do Sistema S

 

As contribuições devidas ao “Sistema S” (SESC, SENAI, SESI, SENAR etc.) sofrerão redução de 50% (cinquenta por cento) por 03 (três) meses para não afetar o caixa dos contribuintes.  

 

Seção 4.03     Do FGTS

 

O governo suspendeu por 03 (três) meses o prazo para os empregadores adimplirem o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) referentes aos meses de março/20, abril/20 e maio/20. O recolhimento posterior poderá ser realizado de forma parcelada, em até 06 (seis) parcelas, sem a incidência de multa e juros, com vencimento da primeira parcela no dia 07 de julho de 2020 e as demais no mesmo dia dos meses subsequentes.

O Ministro Paulo Guedes informou que há um fundo consistente para manter os padrões nos próximos três meses, especialmente em razão do reforço do PIS/Pasep.

 

Seção 4.04     Do IPI

 

O Governo Federal promoveu a redução a zero das alíquotas de importação de 50 (cinquenta) produtos de uso médico-hospitalar necessários ao combate do COVID-19, além de simplificação do despacho aduaneiro desses produtos. A Resolução abrange desde luvas, máscaras e álcool etílico até respiradores, para facilitar o atendimento da população e minimizar os impactos econômicos da pandemia.

 

Seção 4.05     Da atuação da PGFN e dos Débitos Tributários Federais

 

O Ministério da Economia autorizou a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) a suspender atos de cobrança e a facilitar a renegociação de dívidas em decorrência da pandemia. As medidas foram publicadas na Portaria PGFN nº 7.821/2020.  As medidas autorizadas foram a suspensão por 90 (noventa) dias:

  • de prazos para os contribuintes apresentarem impugnações administrativas em procedimentos de cobrança;
  • da instauração de novos procedimentos de cobrança;
  • do encaminhamento de certidões da dívida ativa (CDA) para cartórios de protesto. Nesta hipótese, ressalta-se que a inscrição em dívida ativa continuará ainda a ocorrer, sendo suspenso somente o envio das cartas para primeira cobrança;
  • da instauração de procedimentos de exclusão de parcelamentos em atraso;
  • para a oferta antecipada de uma garantia em execução fiscal, mesmo para aqueles que já tenham recebido a carta ou venham a receber no período;

O portal “Regularize” continua ativo e disponível durante o período de suspensão. Todos os prazos para manifestação/impugnação voltam a correr ao final do período de 90 dias.

Quanto às condições para renegociação/parcelamento, foram adotadas seguintes condições, quais sejam, a) a redução do valor da entrada para até 1% do valor da dívida; b) o diferimento (carência) de pagamentos das demais parcelas por 90 (noventa) dias, observando-se o prazo máximo de até 84 meses ou de até 100 meses para pessoas naturais, microempresas ou empresas de pequeno porte.

 

Seção 4.06     Da Declaração de Imposto de Renda de Pessoas Físicas (IRPF)

 

Apesar das suspensões de prazo e de medidas de cobrança, até o presente momento, não houve prorrogação do prazo para entrega das declarações de Imposto de Renda de Pessoas Físicas (IRPF), sendo mantido o prazo para entrega das declarações até o dia 30 de abril de 2020.

 

Artigo V.      Da Recuperação Judicial

 

Primeiramente, a Recuperação Judicial é muito diferente da falência, isto é, enquanto uma se dedica a recuperar a empresa da crise a outra mira pagar credores da forma mais igualitária após o fechamento definitivo da empresa. 

Na Recuperação Judicial, que exige o cumprimento das regras da Lei nº 11.101/05, o empresário em crise poderá negociar suas obrigações com os credores através de um processo judicial. Este processo determina a suspensão de todos os demais processos (Ações e Execuções) existentes contra a empresa, pelo prazo de 180 dias, além da possibilidade de se tratar também de valores de origem trabalhista ou acidente do trabalho.

Os principais requisitos para que esse pedido possa ser realizado é:  

  • Exercer sua atividade econômica regularmente há mais de 02 anos;
  • Não ter tido decretação sua falência, e caso tenha, que as responsabilidades daí decorrentes tenham sido declaradas extintas;
  • Não ter realizado Recuperação Judicial há menos de 5 anos;
  • Não ter sido condenado e nem ter como administrador pessoa que tenha sido condenado por crimes falimentares.

Adiante, ressalta-se que a lei não deixou de olhar para os pequenos empresários no que tange à recuperação judicial. Desta forma, as microempresas (ME) ou empresas de pequeno porte (EPP), poderão optar entre a Recuperação Judicial tradicional e a Recuperação Judicial através do “plano especial”. Por exemplo, nesta última modalidade há a possibilidade de parcelamento dos débitos em até 36 meses, com o pagamento da primeira parcela em até 180 dias.  

Contudo, nossa primeira orientação, como dito alhures, é prezar pela negociação com seus credores, a nosso ver, talvez seja essa o melhor remédio para os impactos da COVID19 no mercado. Todavia, não sendo possível a Recuperação Judicial poderá ser uma solução, desde que, avaliada após estudo detalhado de cada caso. 

 

Artigo VI.    Das considerações finais

 

Enfim, ressalta-se que a partir do dia 20 de março de 2020 o Poder Judiciário permanecerá em regime de plantão extraordinário até o dia 30 de abril de 2020, por determinação do Conselho Nacional de Justiça (Resolução n.º 313/20). Nesse período, o Poder Judiciário prioriza apenas os casos de extrema urgência, razão pela qual é recomendável que se adotem todos os meios cabíveis para a resolução consensual e extrajudicial.

Por fim, informe-se bem. O empresário bem informado sempre terá mais recursos para agir. Busque especialistas e profissionais com capacidade técnica suficiente para que você confie a estes o futuro da sua empresa. 

 

Belo Horizonte/MG, 27 de março de 2020

 

Adriano Muniz Garcia – OAB/MG 164.484

Bruno Fernandes de Araujo – OAB/MG 157.200

 

Posted on 29 de março de 2020 in Reflexos Jurídicos

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